Não contavam, porém, com uma ameaça escatológica (os “Tao tei”) que amedronta a população protegida pelo extenso muro, atacando-a em intervalos de 60 anos e, no caso, é o exato período dos ataques. Contra esse eminente perigo, William e Pero demonstram exímia perícia de combate, conforme conquistam a confiança do Exército Sem Nome – disciplinado grupo de guerreiros responsáveis pela proteção da enorme barreira. “A grande Muralha” baseia-se num mito chinês acerca dos motivos pelos quais ela, uma das sete maravilhas do mundo moderno, foi construída.
Despendendo 150 milhões de dólares, o filme tem o maior orçamento da história do cinema chinês (embora não seja estritamente nacional) e incontestavelmente é um espetáculo de efeitos visuais conjurado ao atrativo bom elenco, que já faturou US$ 970 mil dólares em pré-estreia nos EUA. É o primeiro em língua inglesa do diretor, realizado juntamente à produção pela China Film Group (China) e pela Legendary Entertainment (EUA), Yimou tenta regressar o cinema chinês às bilheterias ocidentais de Hollywood, dessa vez o desfocando da herança estereotipada de Bruce Lee com Kung Fu/Artes marciais, em função de uma ficção que lembra “Círculo de Fogo (Pacific Rim), 2013” ou a franquia “Godzilla (Gojira)”. Mas, nada de novo no front!
O filme também não se preocupa em desenvolver profundamente as personagens, satisfazendo-se em oferecer denotações para que o espectador imagine rapidamente de onde vieram as habilidades delas, como se desenvolveram e até mesmo como as pessoas conseguiram levantar a grande muralha. Perdeu-se a ótima oportunidade de personificar a maravilha moderna em uma personagem central, inclusive. Aliás, quem espera assistir a um filme que enfoque-se na muralha de uma perspectiva historiográfica irá se arrepender, pois ela é apenas um pano de fundo para a trama entre personagens. Em alguns momentos, contudo, a obra nos chama a atenção através da linguagem, transitando entre falas em mandarim, inglês e, com o chileno Pedro Pascal, gatilhos de poucas expressões em espanhol. Porém, sem profundidade ou lirismo, os diálogos não cativam nem emocionam. O enredo apresenta potencial para ser tratado aos moldes do Realismo Fantástico, mas (infelizmente) não foi a opção dos produtores – eu acredito que seria melhor, afinal, estamos falando de mitologia.
Matt Damon atua bem e convence, assumindo o protagonismo que lhe foi designado, embora as cenas não o possibilitem realizar a imersão categórica que vimos em seu último filme, “Perdido em Marte (The Martian), 2015”, ou em “Gênio Indomável (Good Will Hunting), 1997”, este que lhe rendeu indicações ao Oscar (1998) e ao Globo de Ouro (1998) nas categorias “Melhor Ator”, aquele que lhe rendeu indicação ao Oscar (2015) na categoria “Melhor Ator” e a premiação no Globo de Ouro (2015) na categoria “Melhor ator em comédia ou musical”.
Pedro Pascal, encarnando o papel de um anti-herói, destaca-se menos mas agrada também; para quem assistiu à saga “Game of Thrones” fica difícil não relacionar Pero Tovar a Oberyn Martell, embora sejam personagens exclusivamente diferentes. Está bem arrojado e cativante.
A bela atriz Jing Tian realiza uma boa atuação, não excelente, mas boa; Jing está no elenco de “Círculo de Fogo 2 (Pacific Rim: Uprising), 2018“, também sob responsabilidade da Legendary Pictures e da Universal Studios: esperemos uma atuação aprimorada.
Incomodou-me o fato de o talentoso ator Willem Dafoe não ser tão explorado quanto poderia, mas sua personagem está agradável e corresponde ao seu desempenho normal, mediante uma avaliação otimista.
A atuação que mais chama a atenção, após Damon, é a de Andy Lau, no papel de Wang. O ator está bastante convincente no regimento de seu papel, fazendo com que sua personagem transmita a serenidade idealizada pelos roteiristas, funcionou muito bem.
Se há algo notável no longa metragem é, sem dúvidas, o investimento em efeitos especiais (assistimos em IMAX® 3D), que não estão em grade quantidade (o filme não é longo, afinal, tendo 104 min), mas ricos, bonitos. Apesar disso, os diretores artísticos deveram um pouco na composição da paisagem, acredito que isso poderia ser melhor explorado, a bela paisagem chinesa poderia ter sido mostra com um enfoque mais dinâmico e vasto. O Exército Sem Nome se divide em destacamentos que são identificados através de armaduras coloridas e brilhantes, recordando os queridos Tokusatsus (“filmes de efeitos especiais”, de origem japonesa) que compõem a cultura nerd: Ultraman, Power Rangers, Jiraiya e tantos outros.
Compete alertar que Yimou Zhang, responsável por digníssimas obras premiadas, tais como “O Clã das Adagas Voadoras (Shí miàn mái fú), 2004” e “Herói (Hero; Yīngxióng), 2002”, não apresenta “A grande Muralha” como um segmento equivalente, cuja disparidade poderá causar transtornos para os fãs. De certo que a história representada não se trata de uma narrativa poética similarmente complexa – e nem poderia, dados os propósitos – portanto, temos um Zhang desenhando caminhos fora do comum.
O filme é medíocre e deixa a desejar para um cinéfilo exigente, mas contenta os olhos através dos efeitos especiais. Nada que seja marcante e muito menos inovador. Com poucas batalhas empolgantes, elenco prestigiado e gastos milionários, poderia-se conseguir muito mais.
Com isso, esperamos que Donald Trump não faça o muro, porque Yimou já o fez, e não deu muito certo…