Afirma Pereira é um romance de Antonio Tabucchi que foi recentemente transformado em quadrinho pelo italiano Pierre-Henry Gomont, e trazido ao Brasil pela editora Nemo. A obra escrita originalmente em 1938, aborda a importância do posicionamento político.
A história nos leva à Portugal, década de 30, em meio à ascensão da ditadura salazarista. Pereira, o protagonista, é um viúvo solitário acima do peso, que carrega seus traumas diariamente consigo pelas ruas de Lisboa, no verão de 38. Todos os dias são iguais, religiosamente ele vai até seu escritório e escreve para a página de cultura de um jornal conservador.
A vida monótona de Pereira ganha mais ação quando conhece Francisco Monteiro Rossi, um jovem freelancer contratado pelo próprio para escrever os obituários. O jovem, invés de fazer como seu contratante recomendou, entrega textos que conflitam com os interesses do jornal, elogiando Garcia Lorca e Maiakovski, que vão contra o regime fascista. Francisco não é demitido, ao contrario disso, ambos vão criando uma amizade perigosa, onde o grupo combatente revolucionário a serviço dos republicanos espanhóis fica cada vez mais participante da vida do velho viúvo.
Afirma Pereira mostra a jornada de um senhor após abrir seus olhos e enxergar o que estava além da sua bolha. É a evolução de um homem parado no tempo por três décadas. A real situação política do país vai sendo apresentada à Pereira por meio das batalhas que Monteiro Rossi acaba por se meter e, confiando em seu chefe, o leva a situações das quais o homem não tinha acesso, como abrigar um revolucionário foragido do país vizinho.
Pereira, em meio a toda aquela exposição, percebe que se calar perante o fascismo é como ser conivente. Durante a narrativa, o homem vai entendendo que algumas de suas decisões, como a de achar os escritos do seu parceiro impublicáveis, mesmo que inconsciente, dão voz à ditadura que parecia tão distante, mas já estava tão presente em seu país.
A HQ, diferente do livro, é mais dinâmica e o desenrolar da história é mais fluido e menos cansativo. A arte de Pierre-Henry é simples, pintura fluida e de tons mais sóbrios, combinando com a história. Afirma Pereira lhe rendeu o Grande Prêmio RTL de Quadrinhos e 2016, na França.
Esse é um bom romance histórico. Rápido de ler e com cenas impactantes, não só de guerra, mas também da batalha existencial que Pereira trava diariamente consigo, seja sobre estar fazendo o certo, seu luto ou pela sua saúde.