Vamos ser sinceros aqui: poucos estavam hypados com a estreia de X-Men ‘97. Mesmo o fã mais saudosista da clássica animação dos anos 90 estava com o pé atrás com a nova produção, e não era para menos: o que a Marvel vinha entregando recentemente, seja no cinema ou no streaming, não entusiasmava mais tanto como poderia.
Felizmente, a chegada dos X-Men à “era Disney” pode ser considerada um ponto fora da curva neste sentido, apresentando uma adaptação repleta de aventura, ação, drama e surpresas bem ao estilo dos quadrinhos, assim como uma história recheada de camadas e reflexões sociais.
Dando continuidade diretamente aos eventos vistos na série dos anos 90, vemos a equipe tentando se reerguer após a despedida do Professor Xavier. A lacuna deixada por Charles abre espaço para o desenvolvimento de Ciclope como líder, o que dá finalmente o destaque que Scott sempre mereceu e que nunca foi devidamente apresentado ao público – principalmente vistas nas adaptações cinematográficas da Fox.
Aliás, um grande mérito da história é dar luz a alguns personagens que, se tiveram pouco ênfase em outras produções, aqui tiveram seus momentos de glória. Se Tempestade teve um arco interessante de “morte e renascimento” e Vampira transpira dor e revolta, foi Magneto o personagem que mais se engrandeceu dentro da animação, retratando muito bem o plot principal desta primeira temporada: o discurso político. Erik sempre foi uma figura trágica que, mesmo cometendo diversas atrocidades, atua como um catalisador para o debate sobre tolerância que permeia não só aqui na série como nos quadrinhos também.
Inteligentemente, o roteiro de Beau DeMayo – que também atua como showrunner da animação – se vale de inúmeras alegorias para abordar temas como supremacia branca nos discursos de Bastion, o racismo explícito de Senhor Sinistro e os dilemas ideológicos centrais entre Charles e Magnus. Tudo isso mesclado com alguns dos momentos mais marcantes das HQs dos mutantes, principalmente aquelas escritas por Chris Claremont. Do embate da família Summers com o Sinistro, do medo em volta dos Sentinelas, tudo exala a época de ouro dos X-Men, embalada numa trama novelesca que, se muitas vezes parece corrida demais, consegue ser vem compreendida pelo público em geral.
Neste mesmo movimento, a Marvel acabou se utilizando da estética da época (como os traços e movimentações de personagens, por exemplo) para cativar o público mais fervoroso, mas ao adicionar a tecnologia e a fotografia das animações modernas, o estúdio traz à série um estilo único e marcante. A ação também merece elogios, bebendo de fontes como os animes mais modernos e até fazendo referências aos games protagonizados pelos mutantes – em um episódio, por exemplo, Vampira parte pro combate e muitos de seus movimentos fazem alusão à golpes que a heroína faz em X-Men vs Street Fighter e Marvel vs Capcom.
Claro que nada é perfeito e alguns heróis ficaram durante quase toda temporada atuando como figurantes de luxo – como é o caso de Fera, Jubileu e Morfo. Mesmo Gambit e Wolverine, que tiveram seus destinos como uma das grandes surpresas da temporada, pouco fizeram até seus momentos fatídicos. Já Mancha Solar, Forge, Noturno e Bishop realmente são coajuvantes na trama, orbitando na história da equipe principal.
No mais, a produção traz easter eggs e fan services que deixarão os fãs noventistas da Marvel ainda mais saudosistas. Volta e meia vemos rápidas aparições de ícones como Homem-Aranha, Doutor Destino, Quarteto Fantástico, Vingadores e outros personagens, além de uma participação especial de Steve Rogers – o Capitão América em pessoa.
Sem nenhuma dúvida, X-Men ‘97 é uma das melhores adaptações dos mutantes de todos os tempos e um dos melhores projetos feitos pela Marvel no audiovisual. Mesclando nostalgia com a atualidade, somado a uma narrativa de cunho social (presente na essência das HQ’s), a animação coloca um novo patamar de qualidade não só para o estúdio quanto os possíveis concorrentes… O que não é novidade na história dos heróis de um mundo que os teme.