O que você espera de um livro originado dos quadrinhos? A mesma ação com uma gama maior de informações, talvez? O espaço para incrementar mais a história, que falta nas HQs? Pois é essa a expectativa que tive ao ler ao ver pela primeira vez Homem-Aranha entre trovões.
Escrito por Christopher L. Bennett, autor de várias obras de Star Trek, o livro se passa depois que Mary Jane inicia sua carreira teatral e antes do Aranha entrar para os Vingadores. O autor esclarece que a história também se passa antes da transformação sofrida pelo personagem em O Espetacular Homem Aranha 15-20 (“A queda”, agosto-dezembro de 2004), mas que para entendimento do livro, não necessariamente o leitor precisa conhecer os detalhes da continuidade dos quadrinhos.
Peter Parker é professor do ensino médio e já está casado com MJ, a qual tem uma carreira na atuação muito concorrida e acaba passando pouco tempo livro com Peter. Desde o começo, percebemos que Peter já está há algum tempo questionando seus atos e não consegue se convencer totalmente de que são realmente ‘heroicos’. Sim, essa seria uma ótima pauta pra ser colocada em um livro, já que neste, tem tanto espaço para informações adicionais sobre a vida do herói e o que se passa em sua mente, mas o problema aqui, é que isso acontece o livro todo. São quase 260 páginas de história, onde o personagem principal oscila entre dúvida e falsa certeza da bondade de seus atos.
Também já no começo, o autor perde quase 3 páginas só pra dizer que o lançador de teia não funciona normalmente no meio de uma chuva avassaladora. Ele usa esse espaço para explicar cada detalhe mecânico sobre o funcionamento do lançador, isso pode ser ótimo pra quem é viciado em detalhes e talvez até entenda um pouco desse universo, mas acredito que para a grande maioria dos meros-mortais-leitores, isso chegue à ser muito desinteressante.
A história continua onde Homem-Aranha persegue criminosos de rua, e para não colocar mais vidas em riscos, toma atitudes utilizando métodos que não agradam a população de Nova Iorque, como arrancar o teto de um táxi e arremessá-lo contra o automóvel dos bandidos em fuga. Ao longo dos parágrafos, nos pegamos vendo mais do mesmo: pessoas que odeiam o Aranha e acreditam que ele seja o vilão. Talvez isso e a falta da presença constante de Mary Jane, faça com que Peter comece à duvidar de si mesmo. Enquanto Peter leva seus alunos para conhecerem um Museu, percebe que um crime está acontecendo à poucas quadras dali. Preocupado em não permitir que o crime acabe sendo atraído para aquela direção, ele deixa seus alunos aos cuidados de outra professora enquanto o Homem-Aranha vai averiguar a situação. Chegando lá, se depara com Electro e vários robôs assaltando uma joalheria numa famosa rua de NY onde há dezenas dessas lojas. Depois de muita luta corporal contra os robôs que aparentemente são controlados pelo vilão, Aranha percebe que as criaturas estão saindo de controle, onde vê todos os elementos indo exatamente para a direção que ele não queria, o museu. Homem-Aranha só consegue chegar lá depois que a situação está tragicamente terminada: parte do museu foi posta à baixo, e seus alunos estão entre os feridos. Aranha fica tão abalado pelos seus alunos que não consegue lidar com o problema, aí entram os Vingadores na cena, que prendem Electro e destroem os robôs. À partir daí, Homem-Aranha se vê em uma situação incomum, onde vários crimes cometidos por robôs acontecem, mesmo Electro estando preso durante todo o tempo. Na trajetória para descobrir o real autor dos crimes e mandante dos robôs, Aranha encontra pistas que levam aos mais diversos vilões já conhecidos pelos leitores, e, como não poderia faltar, o hater nº1 do herói, o diretor do Clarim Diário, J. Jonah Jameson. A já conturbada relação dos dois, chega ao limite quando JJJ resolve criar um blog para difamar ainda mais Homem-Aranha, aproveitando os limites (ou a falta) que a internet oferece. A trama é um quebra-cabeças cheio de reviravoltas onde o herói se questiona à todo tempo da sua capacidade e acaba duvidando até de pessoas amadas.
Um ponto altíssimo do livro, é que o autor inclui detalhes de edições passadas das HQs do Aranha, o que é ótimo pra quem não acompanha mas pode ficar por dentro, como o encontro dele com o Doutor Octopus e Morlum. Também temos breves passagens de outros personagens interessantes como Felícia (Gata Negra) e Reed Richards (Quarteto Fantástico).
Eu acredito que Bennett tenha mantido o essencial do Homem-Aranha, como a sagacidade e o humor que são indispensáveis. Mas não acho que ele tenha usado o espaço de forma aproveitosa como poderia, focando muito em detalhes “mecânicos” e abusando demais das crises existenciais do personagem principal. Acredito também, que por ter escrito mais de 12 obras de Star Trek entre 2004 e 2015, Bennett se apegou demais à detalhes típicos de ficção científica, principalmente nesse âmbito de espaçonaves e tecnologia avançada, o que acabou deixando a narrativa massiva. Talvez o excesso de informações sobre outras histórias também acabe sendo um ponto negativo, mas eu particularmente achei interessante, sem deixar de mencionar a também excessiva descrição dos cenários, em que o autor diz nos agradecimentos, que conheceu e estudou os prédios e construções que serviram para as cenas de ação e perseguição; se você mora em Nova Iorque, talvez goste de ter tais referências (ou não, eu acho bem irrelevante), mas quando se tem uma história lida pelo mundo inteiro, não fica legal você descrever detalhadamente quantos andares tem tal prédio, de tal rua, que faz cruzamento com tal e tem vista para tal espaço, certo? Fica cansativo, chato. No mais, penso que quem espera uma HQ em formato de livro, não terá sucesso ao ler Homem-Aranha entre trovões; as dezenas descrições seriam rapidamente trocadas por uma única ilustração em apenas uma página, uma fala. Claro, esperamos adaptações, não cópias, mas como no cinema, adaptações de HQs não são fáceis de fazer, e o mínimo que esperamos, é que não tornem o amigão da vizinhança, em um cara massivo.