Seis anos após Tim Burton nos apresentar a sua visão do país das maravilhas, chegou a hora de Alice retornar às telonas em “Alice Através do Espelho”. Burton sai da direção e assume a produção do longa, enquanto James Bobin (Os Muppets) assume o volante. As semelhanças do novo filme com o livro homônimo escrito por Lewis Carroll, porém, param no título. O roteiro de Linda Woolverton, também responsável pelo filme anterior, aproveita os personagens de Carroll, mas leva a história para um caminho diferente.
“O Tempo não está do seu lado”. Ou pelo menos foi desta forma que a Disney apresentou o novo personagem nos trailers do filme. Sacha Baron Cohen dá vida ao Tempo, que aqui tem forma humana. Ele é um deus responsável por controlar a duração da vida das pessoas, mas não abusa de seu poder. A interpretação de Cohen é divertida e cheia de detalhes, mas o traço mais marcante escolhido pelo ator é um sotaque alemão bastante forte, assumidamente inspirado no cineasta Werner Herzog (O Enigma de Kaspar Hauser). Esteticamente o personagem é muito interessante, seu corpo é cheio de engrenagens como se ele próprio fosse um relógio. Seus ajudantes, os “Segundos”, também seguem o estilo steampunk e, apesar de lembrarem um pouco os Minions quando aparecem pela primeira vez, são desenvolvidos de um jeito bem original e divertido durante o longa, podendo inclusive se unir para formarem novas combinações temporais. Mas o que impressiona mais nesse novo núcleo é com certeza o castelo do Tempo. A sequência onde Alice (Mia Wasikowska) avista a construção pela primeira vez e precisa passar por algumas armadilhas para conseguir entrar nele é uma das mais bem feitas e instigantes do filme. O Tempo pode até não estar do lado de Alice, mas com certeza está a favor do filme.
Ao contrário do seu antecessor, Alice Através do Espelho aborda temas mais sérios como as formas de lidar com a perda, a dor e a solidão, e entra nas relações familiares dos protagonistas dando um pouco de profundidade a eles – apesar de menos do que deveria – que eram apenas rasos e caricatos no filme de 2010. Mais uma vez a Disney apostou em abordar vínculos familiares e em vários momentos isso foi um acerto. O melhor exemplo disso fica por conta da relação de Alice com sua mãe (Lindsay Duncan), que muitas vezes me remeteu a situações cotidianas entre mãe e filha que causam fácil identificação com o espectador, e que tem um desfecho super bonito – apesar de não muito original.
O passado das irmãs Mirana e Iracebeth, respectivamente as rainhas Branca (Anne Hathaway) e Vermelha (Helena Bonham Carter), também foi apresentado de forma interessante. Apesar de ambas continuarem bastante caricatas, o espectador finalmente consegue entender melhor a relação entre as duas e finalmente é revelado o motivo pelo qual a Rainha Vermelha é tão vingativa – e é possível até sentir compaixão por ela em algumas cenas. O problema na abordagem das duas foi o desfecho, totalmente raso e clichê, que acredito ter sido usado ou porque a roteirista ficou com preguiça ou porque mandaram simplificar por conta do tempo de tela.
O figurino e a maquiagem são deslumbrantes, e a maquiagem chega a funcionar quase como um personagem em alguns momentos, especialmente no caso do Chapeleiro (Johnny Depp), que tem a aparência modificada várias vezes por conta do problema pelo qual está passando. Falando nele, o personagem está melancólico e inquieto durante boa parte do filme, mantendo sua personalidade exagerada e afetada basicamente em algumas cenas onde aparece no passado. A atuação de Johnny Depp passa batida, e o personagem não têm tanto tempo de tela.
No final das contas o saldo é positivo, já que o filme tem um desenvolvimento divertido, momentos engraçados e prende o espectador, cumprindo bem o papel de “filme pipoca” para todas as idades. Não é memorável, mas supera facilmente o anterior, dirigido por Tim Burton – não que essa fosse uma tarefa difícil.
“Alice Através do Espelho” estreia nesta quinta (26) nos cinemas.