De acordo com a Associação Brasileira do Déficit de Atenção a prevalência do TDAH gira em torno de 3 a 5% da população infantil do Brasil e de vários países do mundo onde o transtorno já foi pesquisado. Nos adultos estima-se prevalência em aproximadamente 4%. Segundo o DSM-5, levantamentos populacionais sugerem que o TDAH ocorre na maioria das culturas em cerca de 5% das crianças e 2,5% dos adultos. Vanessa Bencz é jornalista e roteirista com um sonho de mudar a realidade de muitas crianças que, assim como ela, sofreram ou sofrem com o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade) um transtorno neurobiológico que não é muito comentado e a partir da sua experiência, a jornalista de 30 anos decidiu escrever a história em quadrinhos “A menina distraída” como um projeto independente que foi financiado através do Catarse, uma plataforma de financiamento coletivo e está fazendo muito sucesso e ajudando as crianças e educadores de várias regiões do Brasil.
A autora conta que em 2012 visitava as escolas de Joinville (SC) falando sobre a importância da leitura. “De vez em quando, falava sobre minha fracassada trajetória escolar e o quanto a literatura me ajudou. Percebi que a questão do bullying chamava muito a atenção dos estudantes e constatei que era preciso falar sobre isso para começar alguma transformação” lembra Vanessa. E assim ela teve a ideia do livro HQ “A menina distraída” que conta a história de Leila, uma garota de 14 anos de imaginação fértil que sofre na escola e trata o transtorno de uma forma lúdica e criativa e ensina as crianças a como lidar com algumas situações como o bullyng. Confira a entrevista:
CDL: Poderia contar um pouco da sua história pessoal?
Vanessa: Desde que me conheço por gente sou apaixonada por desenho. Talvez fosse uma válvula de escape, afinal, eu sempre fui muito tímida e distraída. Aos 14 anos, um professor me pegou desenhando na sala de aula e me deu um baita esporro. Falou que se eu continuasse pensando em ser desenhista, terminaria sendo cartazista de supermercado e uma vergonha para a minha família. Meus colegas de escola evitavam andar comigo e, sempre que podiam, me humilhavam por conta das minhas notas baixas. Nesse meio tempo fui a uma psicóloga e ela me diagnosticou com TDAH. Aí, aos poucos, comecei a me entender e a conduzir a minha vida de uma forma mais feliz e construtiva!
CDL: Pode explicar o que é (TDAH) e quais as consequências para sua vida?
Vanessa: O Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) não é uma doença como a maioria das pessoas fala. É um funcionamento cerebral diferente, a meu ver. As pessoas que se encaixam neste “transtorno” geralmente têm dificuldades na vida escolar, afinal, o sistema educacional tem a intenção de padronizar os jovens num mesmo funcionamento, e os TDAHs jamais conseguirão um rendimento desta forma. Por isso são vistos como preguiçosos vagabundos e burros. Minha trajetória escolar foi um fracasso; eu tinha muito potencial criativo, mas isso nunca foi explorado – pelo contrário. Foi podado e eu fui humilhada por não ter o mesmo rendimento de meus colegas. Hoje eu olho para trás e sinto mágoa por ter sido tão excluída e agredida. Ninguém merece passar por isso.
CDL: Como surgiu a ideia de escrever o livro?
Vanessa: Em 2012 eu visitava as escolas de Joinville (SC) falando sobre a importância da leitura. De vez em quando, falava sobre minha fracassada trajetória escolar e o quanto a literatura me ajudou. Percebi que a questão do bullying chamava muito a atenção dos estudantes e constatei que era preciso falar sobre isso para começar alguma transformação. Foi assim que tive a ideia da HQ “A Menina Distraída”.
CDL: Como foi o processo de escrita e edição?
Vanessa: Extremamente cansativo em todos os aspectos, principalmente no psicológico. Primeiro, porque precisei reviver minha história para conceber o roteiro. Depois, porque escolhi o financiamento coletivo como forma de captação de verba. Administrar dinheiro, equipe de desenhistas e a campanha também foi um baita desafio que graças a Deus foi feito da melhor maneira possível dentro das minhas competências.
CDL: Você teve ajuda ou é um projeto independente?
Vanessa: A verba para realização da história em quadrinhos foi arrecadada através do Catarse, plataforma de financiamento coletivo. Precisávamos de 16 mil. Foi uma alegria conquistar 21 mil, muito mais do que pretendíamos. É um projeto independente, mas que contou com a colaboração de 309 pessoas, mais três empresas: a Bionexo, Target Idiomas e Fono&Cia.
CDL: Fale um pouco da história da personagem do livro e qual o objetivo dele?
Vanessa: A protagonista é a Leila. Ela tem 14 anos, ama desenhar e treinar Kung Fu. Mas as coisas ficam bem difíceis para ela quando tira a primeira nota zero. Vai sofrer bullying de colegas e até do professor. O objetivo do livro é causar empatia no leitor – sei que muitas crianças e adolescentes tem uma história parecida com a minha. Então, quero muito que os jovens leiam e sintam-se incentivados a lutar por si mesmos e pelo próprio futuro, assim como a Leila fez na história e eu fiz na vida real.
CDL: Como você acha que o livro pode influenciar as crianças?
Vanessa: Sem dúvidas. Os jovens são o reflexo daquilo que consomem. É uma pena que muitos não sejam incentivados a consumir literatura e seus derivados como as histórias em quadrinhos. Infelizmente a maioria consome apenas porcarias da televisão e da internet. Mas sei que muitos fazem isso porque não foram apresentados a produtos literários de qualidade. Por isso, fiz questão de parar de reclamar e colocar mãos à obra.
CDL: Como foi o retorno dos fãs?
Vanessa: Incrível. Muito melhor do que o esperado. Elaborei “A Menina Distraída” para se tornar uma ferramenta dos professores, para ser um motivo a mais para as escolas falarem sobre bullying, sonhos e força de vontade. Mas a coisa mal chegou às escolas e já está trazendo até mim depoimentos maravilhosos de quem leu, se identificou e resolveu se levantar para fazer alguma coisa. Isso é maravilhoso. Hoje consigo olhar para o meu passado com mais alivio, pois sei que a HQ está melhorando o momento presente de muitas pessoas.
CDL: O que você espera para o futuro tanto pessoal quanto para o projeto A menina distraída?
Vanessa: O retorno pessoal que eu esperava deste trabalho eu já tive: ter ele em mãos é uma alegria, é a minha vitória. Eu venci aquele professor que um dia falou que eu seria uma vergonha. Eu venci as pessoas que me apontaram o dedo e riram. Eu venci a mim mesma, porque por muito tempo acreditei nas coisas ruins que me falavam. Quanto à autonomia do livro, eu espero que ele ganhe cada vez mais o Brasil e chegue onde tem que chegar: nas mãos dos estudantes. Existem planos de transformar a HQ em teatro, musical e até em filme, mas tudo isso pode esperar. Nesse momento, trabalho em um irmãozinho para “A Menina Distraída”.
Para mais informações sobre o projeto, basta acessar o site ou a página no Facebook.