Depois de 10 anos acompanhando a saga de Eren, Mikasa e Armin em trazer liberdade, paz e prosperidade para os habitantes da ilha de Paradis, o que se pode perceber foi que faltou um encaixe melhor nas últimas peças desse grande quebra-cabeças criado por Hajime Isayama.
Tendo a ótica de alguém quem não leu o mangá original e só acompanhou a história por meio das animações, é possível dizer que não é de agora que problemas na narrativa de Attack On Titan (ou Shingeki no Kyojin, no original) são expositivas.
Desde que entrou em sua “temporada final”, a trama sofre com a falta de profundidade em muitas das decisões tomadas pelo autor, que parece jogar informações sem saber os reais motivos de determinadas situações, se apoiando muitas vezes na suspensão de descrença do espectador.
Por exemplo: a origem do ser que se mescla a Ymir Fritz, quando a escrava cai na abertura dentro de uma árvore enquanto fugia de ser violentada a mando do rei, tem uma explicação pouco clara. Não que a questão precisasse de uma dissecação minimalista, mas entender um pouco mais sobre sua existência daria um sentido melhor à história.
Além disso, personagens como Mikasa e Armin enfrentam desafios significativos em relação ao seu desenvolvimento. Ela, inicialmente retratada em Attack on Titan como uma guerreira empoderada nos primeiros arcos no anime, evoluiu para se tornar uma figura secundária que desempenha apenas um papel emocional em prol do protagonista. Já Armin não só demonstra qualquer progresso em sua abordagem conciliatória, como também protagoniza uma cena controversa ao abandonar – sem mais nem menos – completamente essa postura.
Mesmo Eren não consegue evitar de se transformar dali em diante em nada mais do que um vilão que detém um poder imenso, capaz de determinar o destino de Paradis e da humanidade. Sua personalidade é reduzida aos conflitos resultantes desse poder, sem explorar de maneira mais aprofundada seus traumas, que poderiam ter sido melhor abordados, mas em vez disso, são usados como uma justificativa para suas ações condenáveis e indefensáveis no fim.
O roteiro poderia trazer diversas reflexões mais profundas sobre temas como racismo, xenofobia, totalitarismo e outras questões de grande relevância, mas Attack on Titan acabou permanecendo em um nível superficial de abordagem. Dá a impressão que, no fim das contas, a prioridade da história é criar plots só para exibir a impressionante coreografia dos soldados usando os DMTs (Dispositivo de Manobras Tridimensional) durante os confrontos entre as facções, bem como o poder destrutivo dos titãs originais. Sim, é maravilhoso o que se vê… mas ficar só nisso reduz muito o potencial daquele universo.
Tecnicamente, entretanto, o anime é impecável. O estúdio MAPPA – que também produz outros hits do momento, como Jujutsu Kaisen e Chainsaw Man – pode ter dado uma leve derrapada logo quando assumiu a produção da animação, logo quando o substituiu o Wit Studio, mas aqui eles entregam um trabalho de altíssimo nível.
Yuichiro Hayashi, responsável pela direção de Attack on Titan nesta reta final, tira o melhor da trama com cenas grandiloquentes e ação quase ininterrupta. O que poderia ser uma confusão visual, fazendo com que o espectador não saiba o que está acontecendo na tela, acabou fluindo de maneira excepcional. Ver uma última vez a batalha de humanos contra Titãs impressiona e empolga, fazendo jus ao padrão visto nas temporadas anteriores de Attack on Titan.
Soma-se a isso a impactante trilha sonora, assinada pela dupla Hiroyuki Sawano (veterano em Attack on Titan) e Kohta Yamamoto. O episódio foi puro fan service ao reviver temas memoráveis da animação, trabalhando muito o lado nostálgico e dando o tom dramático e emergencial que as cenas exigiam.
Em suma, a jornada até sua reta final tinha o seu apelo, era satisfatória mas acabou caindo num desfecho agridoce e pouco palatável… e esse não seria um problema, afinal era uma das inúmeras direções que a história poderia adotar, tanto que acabou sendo a adotada pelo autor. O problema está no fato de que ela trouxe resoluções um tanto quanto indigestas para se justificar as atitudes de alguns de seus protagonistas.
Associar as atrocidades de Eren e suas motivações eugenistas às soluções mais convencionais que o gênero shounen sempre traz é, em termos de estrutura, uma escolha lamentável para uma obra como Attack on Titan, que prometia fazer – lá no seu começo – justamente o oposto. E nem uma produção caprichada como a vista aqui consegue amenizar completamente.