Utilizando de cenários de uma Itália diferente do que estamos acostumados a ver no cinema, o diretor Matteo Garrone, diretor de Gomorra, realiza um filme comparando as relações humanas às relações dos cães e seus donos e cães entre si.
Temos o protagonista Marcello, um homem pequeno e fraco que possui um salão de cachorros, interpretado com ênfase pelo ator Marcello Fonte, vencedor de melhor ator no Festival de Cannes pelo papel. Simoncino (Edoardo Pesce), o valentão do bairro, parece um cão raivoso que ninguém consegue chegar perto ou intimidar. Nessa amizade abusiva – o mais fraco é o traficante que vende cocaína para o mais forte, que nunca paga – Marcello acredita que pode domar e controlar o amigo.
No decorrer do filme, presenciamos diversos abusos de poder de Simone, apelido de Simoncino, com todos da vizinhança. A lei do mais forte se aplica nos personagens, uma vez que não conseguem encontrar um meio legal para que o abusador pare com suas ações, sabendo que há impunidade e que as leis nem sempre protegem os mais fracos.
No cenário há também provas do descaso das autoridades como, por exemplo, as ruas com lama, os prédios sem fiscalização e falta de policiamento. Tudo isso contribui para a construção de um ambiente onde cada um deve fazer o que puder para se salvar. Ambiente que levará Marcello ao seu limite.
Não fica claro se o motivo de Marcello fazer tudo o que Simone manda é simplesmente pelo fato do segundo ser mais forte e agressivo. Demora para que ele tome uma atitude e que se imponha diante de seu algoz. Mas tal demora é necessária para que possamos compreender a que ponto Marcello chegou, talvez justificando suas ações.
Na primeira cena do filme, Marcello dá banho em um cachorro forte que late e tenta mordê-lo. Conversando com o animal carinhosamente e pedindo para que ele vire para poder dar banho, ele acha que tem algum controle. Porém, conscientemente ou não, o trabalhador prendeu o cachorro pelo pescoço com correntes, impedindo-o de que chegue perto.
Esta cena, além de um possível spoiler para o decorrer do filme, mostra que por mais que usemos de artifícios educacionais e delicadeza para termos controle sobre determinada situação (com animais ou pessoas), nem sempre é possível. O uso da corrente – ou outro artefato intimidador – é necessário, mas a forma de usá-la talvez seja mais importante do que seu aperto.
7Com atuações ótimas e cenas tensas que nos fazem sentir raiva ou empatia pelos personagens, o filme vale a pena. Para quem gosta de cachorros, também é interessante ver a relação do protagonista com seus clientes.