A primeira metade de Duna, lançada nos cinemas em 2021, é sem dúvidas um filme com suas qualidades, mas é de certa forma “inacabado”. Não é injusto afirmar isso, pois é apenas uma parte de uma trama maior. Com um ritmo por vezes excessivamente lento, ele apresenta ao público um universo repleto de regras e mitologias, mas quando parece que a história vai se desdobrar… acaba abruptamente.
Essa falta de conclusão deixou muitos espectadores frustrados, dando a sensação de terem assistido a uma narrativa complexa e detalhada mas com um final imcompleto, embora a produção exiba um alto valor de produção em cada cena. Contudo, ao concluir Duna: Parte 2, a impressão é que tudo foi planejado para esse momento, mais intenso, acelerado (na medida certa), implacável e explicitamente político.
O cineasta Denis Villeneuve, conhecido por pérolas como A Chegada (2016) e Blade Runner 2049 (2017), demonstra novamente sua habilidade excepcional no deserto de Arrakis, recebendo seis Oscars apenas pelo primeiro filme. Com este segundo capítulo, as chances de mais prêmios são visíveis.
Duna: Parte 2 inicia exatamente onde a primeira terminou, seguindo a jornada de Paul Atreides (Timothée Chalamet), o messias que inicia uma guerra santa para salvar Arrakis da exploração da especiaria. A busca por vingança pela exterminação de sua família o leva a se unir aos Fremen, nativos daquele mundo desértico, para equilibrar as forças do universo.
Com o enredo principal estabelecido de forma lenta e minuciosa no primeiro filme, a sequência não se contenta em repetir o que funcionou e avança para um tom épico, dando passos significativos em direção à conclusão que altera a dinâmica do projeto como um todo.
A história, antes apresentada de maneira maniqueísta, com uma divisão clara entre bem e mal, aqui torna-se mais sutil, explorando tons mais acinzentados e tornando-se assim mais interessante.
Mas para isso, era necessário que houvesse um peso no papel do protagonista, afinal se o público não sentisse isso na tela, seria quase impossível o longa se sustentar… e, para surpresa de poucos, Chalamet entrega aqui um de seus melhores trabalhos. Todos já conheciam o talento do jovem ator, mas sempre havia no ar uma desconfiança sobre sua performance dentro de um projeto dessa magnitude. Contrariando esse argumento, o astro traz um Paul primoroso, com muito mais camadas e em muitas vezes se desnudando do espectro de “mocinho”. É um trabalho deslumbrante.
Já Zendaya, finalmente com mais tempo em tela, oferece uma interpretação envolvente, atuando não só como elo entre Paul e o povo nativo de Arrakis, como também sendo um motivo central para ele tentar evitar seu futuro messiânico.
Mas que surpreende de verdade é Austin Butler como Feyd-Rautha, dominando as cenas com a psicopatia do personagem, trazendo flashes de vulnerabilidade que impedem sua representação de cair em estereótipos. Ausente no primeiro filme, o vilão é apresentado como uma antítese de Artreides, emanando um ar diabólico e, ao mesmo tempo, fascinante.
No entanto, novas adições ao elenco, como Léa Seydoux e Anya Taylor-Joy, têm pouco destaque, sendo subutilizadas. Seydoux, em particular, parece ser uma participação luxuosa, sem impacto significativo. Já a personagem de Anya faz sentido aprecer de relance, mas ainda sim fica um gosto de “quero mais”.
Christopher Walken, no papel do Imperador Shaddam IV, mesmo com poucas cenas, transmite uma complexidade intrigante, mas a falta de tempo na tela prejudica seu impacto na trama, especialmente no terceiro ato.
No mais, nomes como Rebecca Ferguson, Florence Pugh, Javier Bardem, Stellan Skarsgard e Josh Brolin oferecem performances dentro do esperado do que se espera quando são citados em uma produção, servindo como suporte para o tom épico do filme, que cresce ao longo das (quase) três horas de projeção.
Em Duna: Parte 2, Denis Villeneuve opta por captar a grandiosidade desse universo de maneira naturalista e quase documental. Assim, o trabalho de fotografia de Greig Fraser é deslumbrante na representação de diferentes mundos, tornando-se impressionante quando colidem de maneira espetacular e catártica.
A direção de fotografia é complementada por uma performance espetacular da equipe de som do filme, envolvendo o público em uma experiência sensorial única. Os sons do deserto e os momentos de silêncio transmitem o poder e a imponência do cenário, enquanto os vermes fazem a plateia vibrar de emoção. No entanto, esse aspecto quase eclipsa a genialidade da trilha sonora do premiado Hans Zimmer, que, embora não se perca na trama, parece ter recebido menos destaque neste novo capítulo.
Ainda sim, a combinação destes elementos torna o espetáculo de Duna ainda mais denso e implacável. O filme abandona a jornada tradicional do herói e mergulha em tons de cinza mais profundos. Sem respostas fáceis, a produção impacta ao oferecer uma conclusão recompensadora, mesmo trazendo um sabor agridoce.
Em resumo, Denis Villeneuve entrega um excelente trabalho em ambos os filmes, explorando de maneira impressionante esse universo. Duna: Parte 2 é grandioso, impressionante e não teme ser uma fantasia espacial densa e filosófica, agradando não apenas aos fãs da obra original de Frank Herbert, mas também a um público sedento por filmes verdadeiramente grandiosos.