Quando foi revelado que David Benioff e D. B. Weiss, a dupla por trás do hit Game of Thrones, estavam trabalhando juntamente com o escritor Alexander Woo (The Terror) na adaptação do aclamado clássico sci-fi O Problema dos 3 Corpos, a expectativa era enorme sobre como eles dariam vida a essa trama complexa na tela da TV.
Adaptando o livro homônimo de Cixin Liu, que marca o início de uma trilogia literária aclamada no cenário da ficção científica, O Problema dos 3 Corpos é uma série que segue o estilo intrigante e desafiador que cativa quase todos na obra original, apesar do risco de se tornar um emaranhado confuso para quem não está habituado a uma ficção científica mais profunda.
Com oito episódios nesta primeira temporada, cada um com cerca de 50 minutos de duração, a produção apresenta uma história épica que abraça o passado, o presente e o futuro, explorando o maior desafio já enfrentado pela humanidade. Além de impressionantes visualmente, as cenas são provocativas, levantando questões científicas e filosóficas que estimulam a reflexão do expectador a cada final de capítulo.
Dividida em duas linhas do tempo, a história se inicia na Pequim dos anos 1960, durante a Revolução Cultural Chinesa, seguindo a jornada da jovem astrofísica Ye Wenjie. A história se desdobra ao longo de décadas, culminando em eventos catastróficos que ecoam pelo tempo e espaço.
Anos depois, na Londres atual, somos apresentados aos “cinco de Oxford”, um grupo de jovens cientistas cujas vidas são viradas de cabeça para baixo por uma série de mortes misteriosas entre seus colegas.
A série da Netflix adapta com maestria os complexos conceitos científicos do livro para uma linguagem acessível, sem perder a profundidade da narrativa. A exploração desses temas, aliada a uma trama envolvente e repleta de reviravoltas, mantém o espectador intrigado do início ao fim.
Mesmo demorando um pouco para engrenar, a trama nunca se torna entediante, pretensiosa ou excessivamente explicativa. Fica claro que Benioff, Weiss e Woo têm como meta tornar tudo o mais acessível possível, para que o grande público tenha um ponto de entrada neste material complexo e, muitas vezes, obscuro.
Os três livros de Cixin são conhecidos por uma estrutura extremamente complexa e, para muitos, inadaptável para qualquer outra mídia. Assim, muitas adaptações foram obviamente feitas – com a inserção de personagens e ambientações diferentes, para dar uma escala um pouco mais global, por exemplo – gerando um certo desgosto por parte dos fãs mais hardcore da trilogia., mas que funcionam muito bem para o resto do público.
Bem estruturada e planejada, O Problema dos 3 Corpos sabe quando esconder e quando apresentar respostas, e de um jeito bem mais palatável que a obra original oferece. O objetivo é que o público chegue no último episódio da temporada com uma compreensão geral bastante completa de seus conceitos científicos e do que está em jogo, preparando o terreno para uma segunda temporada que promete expandir ainda mais este universo.
Além da riqueza do enredo, a série brilha visualmente, com imagens deslumbrantes que capturam a grandiosidade da história. Desde cenas no espaço até momentos históricos e armadilhas impressionantes, cada detalhe contribui para a imersão na trama. É verdade que os efeitos especiais derrapam em alguns (bem poucos) momentos, mas nunca interferem de modo a tirar a imersão de que está assistindo o episódio.
No entanto, O Problema dos 3 Corpos não se resume apenas a efeitos visuais deslumbrantes e conceitos científicos complexos. Ao explorar os dilemas pessoais dos protagonistas, composto por cinco personagens notavelmente diferentes – os cientistas Jin Cheng (Jess Hong), Saul Durand (Joven Adepo), Auggie Salazar (Eiza Gonzaléz), Jack Rooney (John Bradley) e Will Downing (Alex Sharo) – a trama cria uma conexão emocional com o público, destacando o que torna a humanidade única.
Tudo isso nos traz em paralelo o questionamento da estratégia da plataforma em entregar todos os episódios de uma única vez, uma conhecida e tradicional tática da Netflix. Tendo em mãos uma material tão rico e profundo, é quase imperdoável maratonar uma produção como essa, perdendo a chance de reflexão do que é dito em tela em benefício do consumo rápido. Claro que nada é absoluto, mas se apresentasse os capítulos de forma semanal, a discussão em torno da série seria possivelmente bem maior.
Em suma, O Problema dos 3 Corpos é uma obra corajosa que mergulha de cabeça no universo da ficção científica, oferecendo uma experiência envolvente e instigante tanto para os fãs do gênero quanto para o público em geral. É uma jornada épica que não apenas nos leva aos confins do tempo e espaço, mas também nos lembra da complexidade e da beleza da nossa própria existência.