Pisque Duas Vezes, produzido pela atriz Zoë Kravitz (Batman de 2021), é um longa-metragem que surge sem que se crie muitas expectativas por ser a sua estreia na direção.
Porém, essa ausência de expectativa é perfeita para que não haja tanta cobrança, gerando descobertas durante o filme que se apresenta como uma verdadeira montanha-russa, trazendo novas perspectivas a cada instante, além de inovar ao trazer Channing Tatum (Deadpool & Wolverine) como o vilão da trama.
Pisque Duas Vezes chama a atenção por mostrar um enredo repleto de suspense, que se destaca principalmente pela sonoplastia quase sempre tensa com diferentes sons que cativam e geram distintas sensações a cada um deles, mas que somem com os diálogos e em alguns momentos de descontração, semelhantes aos do filme Corra! de Jordan Peele.
Esses sons se fazem muito presentes durante todo o filme, mas um deles chama mais atenção: o de um relógio contando as horas. Esse, aparece em momentos específicos para gerar ainda mais tensão, pois está ali para reforçar que os participantes da Ilha estão com seu tempo contado, sem que eles mesmos saibam disso, já que sequer sabem em que dia da semana estão ou há quanto tempo estão lá.
A junção da sonoplastia com o roteiro que prende por causar uma certa ansiedade para descobrir o que acontecerá nas próximas cenas, gera ainda mais satisfação em Pisque Duas Vezes, já que em certos momentos do filme, temos acesso somente ao que os participantes também veem.
A impecável atuação de Channing Tatum como Slater King juntamente com Naomi Ackie como Frida cativa o espectador do início ao fim, já que durante quase todo o longa é perceptível a química dos personagens, até mesmo fazendo com que as interações quebrem os suspenses de algumas cenas. Outro ponto positivo para a obra é sua fotografia, que conta com cores vívidas e uma câmera que por muitas vezes se encontra fixa e em primeira pessoa em momentos de tensão, trazendo mais imersão à cena.
Para além do básico de suspense, Pisque Duas Vezes, bem em seu início, traz críticas ao atual sistema econômico, com cenas e conversas que deixam clara a discrepância entre a realidade de pessoas que já nasceram com boas condições financeiras e não têm nada a perder, e a outras que precisam se esforçar para que tenham o básico, como valor para pagar por moradia.
De maneira não tão profunda, no meio do filme durante um jantar, Frida (que é garçonete e por acaso do destino se torna uma das participantes da ilha) é questionada por Vic (um dos milionários que lá se encontram) sobre o que faz da vida, e a mesma alega que ainda está tentando descobrir (no início do filme nota-se que ela sequer possui o valor para arcar com o aluguel), reforçando a desigualdade social.
Há também cenas em que ocorrem diálogos sobre abusos e a forma banal como algumas pessoas ali presentes lidam com ele, o que traz mais revolta pois passa a sensação de injustiça.
No geral, Zoë conseguiu entregar uma boa trama em Pisque Duas Vezes com assuntos atuais e cenas muito profundas durante todo o longa com análise e visão de diferentes classes sociais que nos faz refletir.
Ela foi genial ao adicionar momentos de alívio cômico para que não houvesse tanto ar de seriedade e a tensão fosse quebrada, trazendo a possibilidade de inserir cenas tensas repentinamente, surpreendendo o telespectador, e fazendo com que haja muitas discussões e interpretações ao redor de seu filme.