predador fubdqeufj

Crítica | ‘Predador: Terras Selvagens’ “O conflito entre o autor e a máquina”

Predador: Terras Selvagens estreia nos cinemas com Dan Trachtenberg, trazendo o predador como protagonista em uma releitura ousada da franquia.

5 Min Ler
7.5 Bom
Predador: Terras Selvagens

Em um momento em que grandes franquias se transformam em marcas e diretores em meros executores de propriedade intelectual, Predador: Terras Selvagens tenta provar que ainda há espaço para a autoria dentro do maquinário hollywoodiano. Sob o comando de Dan Trachtenberg, o longa propõe um olhar inédito sobre o universo do caçador intergaláctico: o de enxergar o monstro como sujeito, não mais como ameaça. Essa inversão de perspectiva, no entanto, expõe o principal dilema do filme — a disputa entre a ambição criativa e as amarras do estúdio.

Depois do êxito de Predador: A Caçada (2022), sucesso do streaming e queridinho da crítica, Trachtenberg ganhou autonomia para expandir sua visão. Mas essa liberdade veio acompanhada de vigilância. Terras Selvagens, seu primeiro projeto da franquia voltado às salas de cinema, tenta conciliar o espetáculo visual da ficção científica com a lógica de progressão típica de um jogo de ação. O resultado é um filme inventivo e técnico, mas que raramente ousa sair da zona de conforto.

Crítica | ‘Predador: Terras Selvagens’ "O conflito entre o autor e a máquina"

A trama se passa em um planeta hostil, descrito nos registros da franquia como “o inferno do universo”. É ali que Dek (Dimitrius Schuster-Koloamatangi), um jovem predador banido de seu clã, busca recuperar sua honra. A missão: caçar uma criatura lendária e provar que é digno de voltar para casa. A narrativa segue a estrutura de um percurso iniciático, no qual cada desafio vencido concede novas habilidades e recompensas — uma progressão que ecoa a lógica de exploração e evolução típica das experiências interativas.

Essa linguagem de “jogo filmado” é reforçada pelos coadjuvantes: Thia (Elle Fanning), que oferece momentos de introspecção e questionamento filosófico, e Bud (Rohinal Nayaran), cuja leveza serve como contraponto à tensão constante. Trachtenberg entende bem as regras desse formato e o conduz com precisão.

Visualmente, o longa é deslumbrante. A direção de arte constrói um ecossistema alienígena cheio de texturas, luzes e variações climáticas, e o CGI surge como extensão da mise-en-scène, nunca como distração. Há um certo charme nostálgico nas composições — lembrando o espírito aventureiro dos anos 1980, quando o perigo ainda convivia com o imaginário.

O aspecto mais ousado do filme é justamente a tentativa de humanizar o monstro. Trachtenberg substitui o olhar de horror e brutalidade por uma jornada emocional, em que Dek expressa empatia, constrói laços e questiona a violência que define seu povo. É uma releitura corajosa da figura do predador, que aqui ganha complexidade moral.

predador

O problema é que o estúdio parece não confiar totalmente nessa abordagem. O que poderia ser uma expansão madura do universo acaba se moldando ao formato de aventura familiar: grupo de desajustados que vira uma “família improvável”, vilões caricatos e uma moral de tolerância no final. O instinto selvagem do filme é domesticado por fórmulas previsíveis.

Outro ponto que fragiliza a experiência é o excesso de conexões forçadas com outras franquias. As menções constantes à corporação Yutani-Weyland — referência direta ao universo Alien — funcionam mais como aceno para o futuro crossover do que como parte orgânica da narrativa. Em vez de ampliar o mito, essas inserções acabam dissolvendo a identidade própria do longa.

predador 2

Trachtenberg continua um diretor de ideias potentes. Ele enxerga o cinema de ação como um campo de experimentação narrativa, quase como um labirinto a ser explorado pelo espectador. Mas, em Terras Selvagens, sua assinatura é constantemente podada. O filme se torna, de certa forma, um reflexo da própria condição de seus autores: criadores tentando resistir à padronização dentro da engrenagem industrial.

Mesmo com suas concessões, Predador: Terras Selvagens entrega momentos de grande vigor visual e ritmo empolgante, especialmente nas cenas de combate e exploração. Há sinceridade nas intenções de Trachtenberg e um desejo palpável de renovar o mito. O que se perde é a coragem de ir até o fim dessa proposta.

No fim das contas, o longa é um estudo fascinante sobre os limites da autoria em tempos de controle corporativo. Ele entretém, respeita o legado da franquia e tenta reinventá-la — mas também expõe o quanto é difícil ser selvagem dentro de um sistema que prefere tudo domesticado.

Predador: Terras Selvagens estreia hoje nos cinemas.

Predador: Terras Selvagens
Bom 7.5
Nota 7.5
Compartilhe este artigo