Ao subir dos créditos, depois de quase duas horas de história, uma questão clara deve atormentar o expectador: porque raios Viúva Negra não foi lançado em 2016/2017, ou um pouco antes dos eventos vistos em Vingadores: Guerra Infinita / Ultimato?
A mais nova produção cinematográfica do Marvel Studios chega aos cinemas (e ao Disney+ via Premier Access) mostrando que a heroína vivida por Scarlett Johansson ao longo de todos esses anos ainda tinha muita lenha pra queimar, com um repertório extremamente interessante e que poderia ser melhor explorado nas telas.
Aqui, a ex-espiã russa – que no momento da trama, está fugindo do governo americano devido aos acontecimentos vistos em Capitão América: Guerra Civil – se vê em um confronto com o seu passado ao se deparar com sua “irmã” Yelena, interpretada pela estupenda atriz Florence Pugh (de Midsommar). Esse encontro faz com que Natasha crie coragem para enfrentar seus fantasmas e exorcizá-los, partindo assim em uma missão para desmantelar o que resta da fatídica Sala Vermelha, onde o então governo soviético antigamente preparava seu exército de assassinas.
E mesmo seguindo uma fórmula clássica do estúdio, um grande mérito do longa é que ele não se mostra apressado – há uma fluidez quase que natural entre os momentos de introspecção da personagem com aquelas doses de humor e ação típicos da Marvel.
A diretora Cate Shortland, pouca conhecida do grande público, demonstra habilidade ao equilibrar essas variações nessa história de roteiro simples e pouco inventivo, especialmente nas cenas mais intimistas, com Natasha acertando as contas com sua “família”. Já no quesito ação, ela opta por desenvolver uma mescla entre os estilos “Jason Bourne e Marvel” de ser, agradando na maioria das vezes (principalmente quando o embate é mais físico e real do primeiro).
Quanto ao elenco, é nítido a química entre o cast principal: Johansson mantém o nível de excelência ao entregar cenas de ação convincentes e uma Natasha navegando entre a sensibilidade e rigidez. Já David Harbour vem para ser o claro alívio cômico, com um Guardião Vermelho amargurado por não ter o mesmo reconhecimento (e glórias) de seu ‘adversário’ americano. Preso nessa ideia, Alexei não consegue lidar com as questões mais privadas que o circula, rendendo momentos bem divertidos.
Por sua vez, Rachel Weisz pouco faz em cena. É verdade que Melina Vostokoff tem certa relevância no ato final do filme, mas a verdade é que a presença da excelente atriz não é aproveitada de maneira satisfatória, principalmente pelo fato que o próprio background de sua personagem a possibilitaria em ter mais peso no contexto da história. Ainda sim, é sempre bom ver na tela o talento de Weisz, mesmo que por pouco tempo…
Assim como os antagonistas do filme: enquanto que Ray Winstone faz um vilão soviético genérico (bem no perfil daqueles vistos na franquia 007 nos anos 80) como Dreykov, o aguardado Treinador também pouco se mostra relevante, servindo somente para os combates em si. Nem mesmo a revelação de sua identidade que, em tese, teria o efeito de um plot-twist interessante, tem o peso merecido. Não é ruim, mas longe de ser algo que venha a surpreender o público.
Entretanto, é necessário dizer que a grande atração de Viúva Negra é sem dúvida alguma é a performance de Florence. Reconhecidamente uma das melhores atrizes da nova geração, a jovem traz para o MCU uma Yelena com um carisma absurdo, ganhando o expectador logo de cara com seu jeito petulante, chata (no bom sentido), mas que tenta se ajustar à sua nova realidade de ser quem ela quer ser, sem mais as amarras como uma agente da Sala Vermelha.
A personagem parece que está em um estágio de redenção similar ao que sua irmã estava pouco antes de ingressar à finada S.H.I.E.L.D., o que pode render boas histórias – se o pessoal da Marvel não fazer a mesma coisa que fizeram com a sua antecessora, claro. É uma importante adição a esse universo, ainda mais levando-se em conta o que se vê nas cenas pós-créditos (claro que haveria um, né?)
Plots como abuso e liberdade são explorados no filme e, tendo mulheres nos pontos principais da trama (e na produção), acabam tendo um peso diferente do que em outros longas do mesmo gênero. Nada muito aprofundado de fato, mas que serve para mover a história e dar outros contornos aos conflitos.
Assim, Viúva Negra entrega uma aventura divertida e que faz uma justiça tardia a essa excelente personagem. É uma trama fechada, com poucas ramificações para explorar daqui pra frente. Além disso, apresenta uma heroína que, se bem trabalhada, pode suprir a falta que a superespiã fará.
Que o Marvel Studios não cometa mais o deslize em valorizar tardiamente suas heroínas… Produções como WandaVision, The Marvels, She-Hulk e Ms.Marvel parecem mostrar que eles aprenderam isso. Os fãs agradecem.