“Pieces of a Woman” é um filme de 2020, lançado em setembro pela Netflix. O longa é dirigido por Kornél Mundruczó e roteirizado por Kata Wéber. É baseado em uma peça que ambos escreveram e encenaram em seu país de origem, a Hungária. O filme é uma produção original da vermelhinha, mas tem como produtor executivo nada mais nada menos do que Martin Scorsese.
Aqui, conhecemos a história de Martha Weiss (Vanessa Kirby), uma mulher que está no final da gravidez e decide ter seu parto em casa. Seu marido, Sean Carson (Shia LeBeouf), é um homem com um passado traumático devido ao alcoolismo, mas ele está sóbrio há 6 anos e a apoia com amor durante todo o processo de gestação. Tudo muda quando Martha tem complicações durante o parto e a bebê não resiste.
O tema central do longa é o luto materno, paterno e todas as complicações que desestabilizam o que essas pessoas construíram juntas. A dor da perda em “Pieces of a Woman” é demonstrada de forma extremamente sensível e honesta. O evento traumático isola e afeta a todos ao entorno da família e, de alguma forma, faz com que a vida permaneça estagnada em meio a difícil tarefa de seguir em frente. Isso gera com que certos indivíduos busquem por justiça onde não há, seja no fundo de uma garrafa, no isolamento da sociedade ou no próprio sistema judicial – no fim, a busca pela conformação tem de estar dentro de cada um.
A fotografia do filme é como uma dança. No primeiro ato, acompanhamos o parto de Martha de forma ininterrupta, sem cortes, em um plano sequência que é de tirar o fôlego. A câmera acompanha o estado emocional dos personagens e quando as coisas começam a dar errado, a movimentação da fotografia consegue incomodar profundamente o espectador. A imersão é absurdamente bem feita. Ao decorrer do resto do filme, a direção fotográfica assinada por Benjamin Loeb se utiliza de planos interessantes, mas fica mais conservadora e não ousa como faz na cena em que mais precisa. O resultado é precioso e é extremamente injusta a não indicação do filme a essa categoria do Oscar.
A direção falha e acerta. Por começar o filme em seu ponto mais alto, o espectador pode não querer mais acompanhar o filme em seu desfecho porque ele não é imprevisível, mas é construído com excelência. Kornél Mundruczó sabe o que quer mostrar e faz com sutileza, sem ser desnecessariamente expositivo. O diretor não inova tecnicamente em nenhum ponto, mas faz escolhas inteligentes no decorrer do filme todo, sendo o seu maior mérito o direcionamento que dá ao elenco, o maior trunfo do longa.
A atuação em “Pieces of a Woman” é o que faz do filme uma obra de arte. Vanessa Kirby é absolutamente incrível por todo o filme e nos impressiona em todas as emoções que passa. A dor do parto parece real, assim como a dor introspectiva de ter que lidar com a mágoa. Kirby recebe uma indicação ao Oscar com muito merecimento e é até melhor do que algumas das cotadas a vencer.
Shia LeBeuof também dá um show, desde os momentos de fragilidade em que sofre a impotência de não poder ajudar sua mulher, mas também nos instantes em que raiva e braveza tomam conta de seu personagem. Ele também passa excelentemente o retrato do trauma que a situação causa e o amor, carinho e cuidado em seus olhos viram outra coisa.
O filme ainda conta com a participação de Ellen Burstyn, Sarah Snook e Molly Parker, todas demonstrando um papel muito bem construído e uma atuação precisa, onde cada uma tem o seu momento de brilhar e nos fazer lembrar delas.
“Pieces of a Woman” é muito bom. Sua sensibilidade, aliada de um bom direcionamento técnico potencializam a história que está sendo contada. A atuação é um ponto altíssimo e parece muito natural, sendo extremamente tocante principalmente a pessoas que já passaram por uma situação parecida, mas não deixam a desejar em nenhum momento. Para os amantes do cinema e apaixonados por grandes atuações, esse é o filme certo. Não é perfeito, mas é muito bonito e honesto em sua proposta – e se o espectador permitir, a emoção definitivamente vai tocar a ele.