Trabalhar, obter conhecimento, namorar, comer, foder, conseguir dinheiro e status, drogar-se, buscar a felicidade….. Esses são alguns dos elementos contidos em uma bolha, a qual daremos o nome de vida. O indivíduo, inserido nesse mecanismo, busca o melhor para si o tempo todo, fazendo o possível e o impossível para, ao menos, sobreviver. Paralelo a esse mecanismo, encontra-se algo muito especulado, mas ainda totalmente desconhecido. O homem a teme, ele tenta identificar meios, através de alguns componentes do mecanismo vida, para se safar daquilo que ele não tem nenhum poder sobre, e basta um movimento seu para quebrar o sistema: a morte.
“A morte é o que há de mais duro quando vista de fora e quando se está de fora dela. Porém, uma vez dentro, experimenta-se tal sensação de completude, de paz e de realização que não se quer voltar.” (C.G.Jung. Leters, vol 1)
Alguns indivíduos, no entanto, não suportando mais a vida que levam, não enxergando quaisquer perspectivas, quaisquer fundamento, resolvem eles mesmos se entregarem ao desconhecido, na esperança de que suas dores existenciais sejam cessadas. Albert Camus dizia que uma grande questão da filosofia era se a vida valia a pena de ser vivida ou não. Bem, uma constatação é que a modernidade carrega consigo um pseudo hedonismo, sendo a vida banalizada pela sociedade de consumo. Já não há um caráter sagrado aqui. Ainda assim, um suicídio não é decidido repentinamente. É um ato bem planejado, ocasionado por uma dor, um incômodo, um trauma que o indivíduo carrega há anos. Em suma, um bom motivo é de fundamental importância. Ninguém coloca uma arma na boca, primeiro sentindo o atrito e frieza do metal, imaginando na consequência daquela grande potência, e finalmente aperta o gatilho por brincadeira.
Todos nós, em algum momento, já pensamos ou vamos pensar em nos matar, mesmo que seja um pensamento que logo se evapore. Estamos sujeitos às armadilhas do grande mecanismo, e é inevitável que em algum momento o pensamento suicida nos venha a calhar. Acontece que, com alguns, as ideias logo se rearranjam, um motivo para viver é revisto e, então, damos seguimento à nossa jornada. Com outros, no entanto, os embaralhos mentais já adquiriram proporções tão grandes que eles realmente vão colocar o ato em prática. Alguns o realizarão apenas por um pedido de ajuda. Não será algo tão nocivo ao seu sistema fisiológico, e essa será a hora de agirmos o mais rápido possível. Outros não. Outros estarão decididos a morrer. E assim eles farão.
O suicida ainda é mal visto. Ele é considerado ingrato, egoísta e tratado por uma regra exata, fixa e cartesiana, como se o fenômeno humano não fosse ímpar, digno de suas histórias completamente particulares. Estando nós arraigados à ideia de que precisamos sofrer para sermos felizes, esquecemos de humanizar o suicida. Se dissermos, por exemplo, que um dito cujo se jogou de uma das torres gêmeas por já prever sua morte de outra forma, a maioria de nós irá concordar com o ato de fuga da dor que se fazia insuportável. Bem, essa dor não deve ser muito diferente daquela psíquica… o que leva seres a sucumbirem a própria vida? Precisamos pensar na angústia e no vazio que preenche as entranhas de tal criatura, e não apenas culpar aqueles que já não suportam mais aquilo no que estão inseridos. O caminho mais fácil, o da culpa, não esclarece nem educa. É preciso transformar os sentimentos e não amedrontá-los.
O que mais me instiga em um suicida é sua coragem, sua imaginação, seus pés. Uma criatura que, muitas das vezes, já não satisfeita e vazia de sua redoma, busca algo que não encontra. Frustrado e com alguma gota d’água, explode uma mente que sofre, que gritou durante anos pedindo socorro e as pessoas que o cercavam não perceberam.
Algo que as pessoas precisam entender, que esse tabu salienta, é que um suicida não deseja morrer, ele só está buscando aliviar sua imensa dor desesperadamente.