Nostalgia está na moda – essa afirmação chega a ser redundante – e quando a aplicamos ao audiovisual vamos além. Gostamos de nostalgias na narrativa, nas referências, no contexto e, no realidade, em tudo o que pode nos aproximar ainda mais de um tempo que nos faz falta ou de algo que mexe com o nosso íntimo. Esse gosto, entretanto, não quer dizer que o público não queira algo novo e, ainda que possua um roteiro simples até limitado, Jogador N°1 acerta ao explorar que cultura pop é tudo e para todo mundo em um filme no qual você não precisa entender todas as referências, pois, em algum momento, você será contemplado com algo ou alguém da sua infância, que ajudou a moldar o seu caráter e, quando você suspirar ao sentir a nostalgia, o filme terá cumprido o seu objetivo.
O filme tem como contexto uma quase distopia, onde ninguém se interessa pela vida real e preferem passar todo o tempo e construir as suas vidas através de uma realidade virtual, conhecida como OASIS – nada muito diferente da matrix criada por Willian Gibson, além de o longa não se dar o trabalho de explicar muito sobre como chegamos até ali, apesar de não ser tão difícil de imaginar como. Isso torna essa realidade algo antagônico à matrix que conhecemos e que já foi explorada em diversas outras ficções-científicas, principalmente no filme homônimo (Matrix, 1999), já que, aqui, as pessoas querem e muitas vezes tem a necessidade de ficar conectadas, pois o mundo real e o virtual se articulam diretamente.
O longa se desenvolve através da fórmula já batida do garoto branco, o personagem Wade Watts (ou Percival) e seus parceiros estereotipados e rasos Aech, Daito e Sho, além, é claro, de seu interesse amoroso: Arth3mis. Todos eles se unem contra um vilão que é projetado no homem de terno, porém é o protagonista – e somente ele – o escolhido e destinado a grandeza, algo que ele decide partilhar com os seus. O filme, entretanto, em nenhum momento tenta questionar ou dar mais camadas para essa abordagem, principalmente quando lidamos com cultura pop onde tudo é propriedade intelectual, e esse próprio universo é controlado por pessoas de ternos e não por nerds apaixonados, sendo uma questão estrutural e não meniqueísta. A visão do nerd também é muito romantizada, de uma maneira até mesmo ultrapassada, sendo visto como o outsider, o excluído e incompreendido, que não possui a mesma malícia que as pessoas “normais”, porém de coração puro e de grande coragem. Tudo isso ignora o fato de que nerds são partes ativas da sociedade e uma parcela expressiva é feitas por pessoas intolerantes e com síndrome de protagonismo.
Mas toda essa limitação se torna uma parcela ruim e pequena de um filme que vai além. O primeiro ponto alto é o fato de que, em um mundo de referências e de easter eggs, tudo pode e é relacionado a cultura pop, indo de música, a filmes, a séries, a games, enfim, a TUDO, algo que torna o mundo mágico. Toda essa nostalgia é uma ferramenta da narrativa, não apenas referências jogadas na tela para agradar, tudo tem uma função específica no enredo, o que deixa o universo ainda mais rico. Outro ponto forte é a temática, aquilo sobre o que o filme realmente é: uma jornada na mente de um gênio, porém mortal, que não se orgulha do que criou e é cheio de arrependimento. A cada desafio que o grupo avança, e a cada filme, música ou jogo que marcou sua vida, em momentos específicos, conhecemos mais sobre James Donovan Halliday, o criador do jogo, seu passado e tudo o que ele gostaria que fosse diferente, tornando o jogo uma extensão de si mesmo.
Jogador nº1, portanto, se torna uma deliciosa jornada aberta a todos se identificarem e se reconhecerem dentro desse vasto universo. Uma visão diferente de uma realidade virtual, que identifica e exalta a importância de produtos da cultura pop e como elas ajudam a moldar a nossa vida, tanto para os bons momentos quanto para os maus.
Devido as suas limitações, o único debate que vai ser levantado, porém não menos divertido, é sobre qual seria seu avatar nesse mundo, eu já sei o meu, seria o Mighty Morphin Power Ranger Verde, com uma Hattori Hanzo que usaria um Lugia para se locomover para lá e pra cá.