O Passageiro é o mais recente filme daquele que, talvez, seja o último astro do cinema de ação que não se rendeu e nem depende de uma grande franquia. Liam Neeson interpreta, dessa vez, um ex-policial chamado Michael (apesar de mais parecer estar interpretando a si mesmo), que, após a aposentadoria, tornou-se um vendedor de seguros, vivendo uma vida comum no subúrbio com sua mulher e filho. Sua vida tem uma reviravolta, o que resulta em um thriller que parece com uma fusão entre “O Assassinato no Expresso do Oriente” (se tivesse sido dirigido por Hitchcock) e “Busca Implacável” (que talvez seja o título de maior expressão protagonizado por Neeson).
A montagem com que o filme se inicia não é das melhores, é apenas uma saída simples para estabelecer as bases sobre as quais o personagem será trabalhado. O único ponto dessa introdução que funciona bem é quando vemos os momentos em que Michael está no trem ou nas estações, que faz com que, qualquer pessoa que tenha vivenciado uma situação onde tomava a mesma condução, no mesmo horário, todos os dias, se identifique com o personagem.
O filme engata quando passamos a acompanhar um recém-desempregado Michael, que se depara com uma mulher misteriosa (Vera Farmiga) sentada de frente para ele no vagão do trem de volta para casa, com quem tem uma estranha conversa sobre um experimento com uma situação hipotética. Ela lhe pergunta se ele localizaria um passageiro dentro do trem, com pouquíssimas informações (sabe-se apenas um nome falso, o fato de que essa pessoa não costuma estar nesse trem e de que está carregando uma bolsa), em troca de 100.000 dólares. Ela deixa de fora, inicialmente, o fato de ter sequestrado a família do protagonista – o que é um incentivo considerável, apesar de clichê, diga-se de passagem. Sem saber do último ponto, Michael acaba aceitando o trabalho, o que levanta a famosa questão de “até onde você iria por dinheiro”.
Aqui temos uma situação interessante, trabalhada algumas vezes no decorrer do filme, que é uma crítica à crise de 2008, principalmente focando na ganância de grandes empresários e banqueiros (personificada pelo personagem de Shazad Latif) e na situação em que ficaram os membros da “classe média americana”, algo que o protagonista faz questão de enfatizar em uma das cenas mais marcantes do longa. O problema é que, na maior parte das vezes em que temos esse tema abordado, ele não passa muita veracidade pois, ainda que Michael tenha acabado de ser demitido e esteja em uma situação financeira complicada (100.000 dólares não resolvem sua vida completamente, mas seriam sua salvação momentânea), a sensação que temos é de que o restante do mundo parece estar bem, ou então ter esquecido do que ocorreu já há dez anos atrás, o que deixa tudo um pouco fora de contexto.
O mais importante em um filme de ação é, obviamente, aquilo que dá nome ao gênero, e é aí o local de onde podemos tirar os pontos mais positivos do filme, que só conseguem se sustentar por conta da parceria de Liam Neeson com o diretor Jaume Collet-Serra. Apesar de alguns momentos serem absurdos e beirarem a comicidade (algo que parece ser inerente a esse tipo de filme), com CGI exagerado e ruim, as cenas são muito bem dirigidas, algumas lembrando, inclusive, a saga “Bourne”, que explora muito bem combates corpo-à-corpo em locais fechados e apertados, bem como a utilização de itens não convencionais nesses momentos – ver Neeson atacando seu inimigo com uma guitarra é muito satisfatório.
O diretor ainda nos apresenta qualidades no que diz respeito à maneira como enxergamos o filme: inicialmente não pensaríamos que existem tantas maneiras de se filmar um trem, mas Collet-Serra consegue encontrar diversos ângulos e movimentos de câmera para fazê-lo, de modo que conseguimos entender exatamente onde está o quê e como o veículo se comporta. Outra coisa que chama a atenção é a atuação de Neeson, que se encaixa perfeitamente no filme, e está no mesmo nível de sempre, com apenas algumas mudanças que podem ser vistas por conta da idade – algo que é aproveitado nas cenas de ação, já que o personagem (assim como o ator) não possui mais o mesmo vigor de outrora – o que passa uma sensação de veracidade.
O ponto mais fraco fica por conta do roteiro, que possui diversas falhas e resoluções simples demais, contando com um plot twist que não pega ninguém de surpresa, já que é possível vê-lo chegando a uma distância considerável. A falta de um explicação final sobre o motivo do porquê tudo isso estava acontecendo incomoda, faz perder o sentido da jornada e deixa um vazio grande que poderia ter sido melhor explorado, já que é repetido diversas vezes que há uma grande conspiração, mas ninguém diz do que ela se trata. Não há, também, grandes inovações no enredo pois, além dos clichês do “ex-policial” e da família em perigo, muitos outros gatilhos do longa parecem ter saído diretamente de filmes anteriores do ator, quase como se bebessem de um subgênero chamado “Liam Neeson”.
Precisamos lembrar, é claro, que o objetivo desses filmes não é conter um enredo complexo e cheio de nuances, necessariamente, mas sim ser um filme agradável e divertido, que não necessite de grande esforço para ser aproveitado. “O Passageiro” cumpre o seu papel, mas não marca seu nome na história recente dos filmes do seu gênero e, no máximo, será contabilizado como mais um filme de Liam Neeson, sendo um filme esquecível de um ator que só é lembrado nos momentos em que seus filmes são lançados.