“O Processo” é um documentário brasileiro que oferece um olhar sobre o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
Dirigido pela premiada cineasta Maria Augusta Ramos, “O Processo” investiga os bastidores da política nacional que levaram o Brasil a uma grave crise política e econômica desde 2013 e os bastidores do processo de impeachment que culminou com a destituição definitiva de Dilma Rousseff do cargo presidencial em 31 de agosto de 2016.
Durante nove meses, Maria Augusta Ramos colocou suas câmeras dentro do Congresso Nacional para acompanhar os trâmites do rito processual, especialmente o lado da defesa da presidente Dilma Rousseff. Acompanhamse as atuações políticas dos senadores petistas Gleisi Hoffmann (PT-RS), Lindbergh Farias (PT-RJ) e do advogado geral da União, José Eduardo Cardozo.
O processo de impeachment iniciou-se em 2 de dezembro de 2015 com a aceitação pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, de uma denúncia de crime de responsabilidade fiscal oferecida pelo procurador de Justiça aposentado Hélio Bicudo, pelos advogados Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal.
Com nitidez, nota-se que a fragilidade de Dilma Rousseff, como presidente, foi usada por Eduardo Cunha como chantagem política para escapar do processo de cassação do mandato, no Conselho de Ética da Câmara, por conta de contas bancárias secretas na Suíça. Por não ceder, o pedido de denúncia foi aceito.
“O Processo” defende a tese de que não houve o crime de responsabilidade fiscal e, portanto, não teve motivos para o impeachment. O processo foi inconstitucional. Se a Presidente não teve o cargo restituído, o rito foi político.
Durante a desconstrução dos argumentos usados no processo de impeachment, as incoerências do golpe de 2016 revelam-se:
– Como homens brancos vindos das elites, em pleno domingo, em votação aberta televisionada pela maior emissora do país, poderiam usar como justificativa de voto que era pela família brasileira?;
– Michel Temer, o vice-decorativo, teria tramado contra a presidente Dilma Rousseff se não fosse uma mulher? O golpe parlamentar foi misógino?;
– Como a advogada de acusação, Janaína Paschoal, poderia participar do processo de impeachment se recebeu R$45 mil reais do PSDB, o partido derrotado nas eleições de 2014?;
– Se a chapa foi composta por Dilma e Temer, o crime de responsabilidade fiscal teria sido cometido por ambos. Por que apenas Dilma Rousseff foi destituída do cargo?;
– Se outros mandatários do Poder Executivo já utilizaram as pedaladas fiscais, por que apenas Dilma foi punida?;
– Como o vice-presidente Michel Temer, eleito na chapa presidencial, sob o plano de governo de Dilma Rousseff chamado “Mais Mudanças, Mais Futuro”, poderia governar com as medidas da “Ponte para o Futuro”, o programa do MDB?
É importante salientar que Dilma Rousseff não é a principal “personagem” do documentário. Aqui as figuras políticas que construíram a atual configuração política tem mais destaque, como Eduardo Cunha, Romero Jucá, Aécio Neves, Michel Temer e a Operação Lava Jato. Termos técnicos e jurídicos são usados à exaustão. Os fatos são contados em ordem cronológica até os dias atuais.
Os eventos de 2016 ainda reverberam no Brasil, às vésperas de um novo pleito presidencial. Em 2017, as denúncias contra o atual presidente Michel Temer foram arquivadas, por duas vezes, na Câmara de Deputados. Um presidente impopular, ilegítimo, avaliado positivamente por apenas 4% da população e o primeiro da história a ser acusado formalmente de corrupção.
Passados dois anos do golpe parlamentar, o povo brasileiro tenta sobreviver em meio de 14 milhões de desempregados, com a retirada de direitos dos trabalhadores pela Reforma Trabalhista, uma frágil educação pública enquanto tentam aprovar a lei da “Escola Sem Partido” e as disciplinas que estimulam o pensamento crítico dos alunos, como Filosofia e Sociologia, são ameaçadas de serem retiradas da grade curricular obrigatória, a saúde numa eterna fila de espera por consultas, exames e cirurgia e a incerteza se estarão vivos no caos da segurança pública.
A população brasileira, de classe média, elitista e preconceituosa, foi manipulada por mídias hegemônicas sem se dar conta que se autossabotou no processo. Nota-se que um dos principais candidatos na corrida presidencial utiliza do discurso de ódio e a revolta da população para subir nas intenções de voto. Precisamos, como sociedade civil, pedir desculpas pelos erros cometidos, pagar pelos nossos atos e recomeçar o país com mais ética.
Durante as duas horas e vinte de projeção, em tempos de polarização política, “O Processo” não tem imparcialidade. Tem claro posicionamento político. E é ótimo. Da primeira à última cena, não há respiro. Evoca-se o livro alemão “O Processo”, de Franz Kafka, cujo protagonista sofre um longo processo judicial, em um julgamento com cartas marcadas e sem o direito de ampla defesa.
Para quem não entendeu o golpe parlamentar, passo após passo, pelo senador Romero Jucá (MDB-RR): “Eu só acho o seguinte: Com Dilma não dá. Conversei com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem: “Ó, só tem condições sem ela”. Enquanto ela estiver aí, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca. Entendeu?
Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo. Os caras dizem que vão garantir. Eu acho que tem que ser um pacto. Eu acho que a gente precisa articular uma ação política. Se é político, como é a política?
Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria. É um acordo, botar o Michel num grande acordo nacional. Com o Supremo, com tudo. Aí parava tudo. Delimitava onde está, pronto.”
FICHA TÉCNICA
Nome: O Processo
Diretora: Maria Augusta Ramos
Gênero: Documentário
Duração: 240 min
País: Brasil
Distribuidora: Vitrine Filmes