Anne-Charlotte Gauthier, autora de “O Enterro das minhas Ex”, retorna aos quadrinhos trazendo um tema de grande importância a ser abordado e debatido atualmente: a questão de gênero. A transexualidade ganha notoriedade em “Justin” (Editora Nemo, 2018), ao relatar a caminhada da personagem Justine, uma menina que não se identifica com seu gênero sexual desde criança e sua sofrida trajetória em busca do reconhecimento de sua real personalidade.
Ao longo da história, Justine tenta apresentar à sua mãe seu “verdadeiro eu”, mas a ignorância e o repúdio falam mais alto, tornando o diferente inaceitável. As crianças de sua escola também não a entendem e, por isso, Justine sofre diversos tipos de agressões e bullying. Em um desses episódios, é despida no vestiário feminino e humilhada em meio à outras garotas de sua sala.
Justine cresce e vive uma adolescência distante de outros jovens, carregando consigo adjetivos pejorativos dados pelos próprios. Em um determinado momento, decide tentar um relacionamento com uma conhecida e nele se descobre transexual.
Essa resposta, porém, não é suficiente e a deixa ainda mais desnorteada quanto à sua identidade, o que a leva a questionar-se ainda mais e a buscar ajuda médica. As visitas frequentes a alguns psiquiatras que a tratam como doente, fazem Justine entrar em depressão e tentar viver uma vida heteronormativa, o que não dá muito certo. A partir dessa experiência nada satisfatória, Justine, agora como Justin, empenha-se em reconstruir a sua vida como o menino que sempre foi e quis ser.
De forma muito delicada e sutil, a autora entra em assuntos pesados sem abandonar a didática e se utilizando de uma linguagem bem simples. A graphic novel é bem curtinha – com apenas 104 páginas – não aprofunda muito o assunto, mas explora o bastante para entrar na lista de livros necessários nas demais estantes. A ilustração em preto e branco é trabalhada para fazer parte do drama envolvido na narrativa, impossível conter emoções!
Obras com essa temática, que promovam tamanha reflexão, são absolutamente escassas, principalmente em formato HQ. A importância da leitura de “Justin” vai além de uma história com final feliz e de fácil empatia com o personagem. A trama conta o mínimo da vida de milhares de homens e mulheres trans, que acabam passando por momentos parecidos ou até mesmo piores, e que precisam ser lembrados e acima de tudo, respeitados por suas escolhas.