Eu adoro esse momento que antecede a tempestade como se tudo ficasse em suspenso esperando sua chegada. Me traz calma na alma. O céu negro como a muito não se via, negro como os olhos daquela moça em acessos de fúria. E ela veio com toda a sua força e glória, inundando tudo, desde as minhas janelas até as pequenas rachaduras em prédios e asfaltos invadindo cada espaço. Ela vem como a paixão, nada escapa de ser inundado e invadido por ela, atravessa barragens e barreiras mesmo que a gente tente impedir.
A terra, que já ansiava por matar a sede, agora se delicia com uma união perfeita, como duas almas que se encontram depois de muito tempo separadas. E assim, o cheiro da terra molhada invade o quarto e me abraça e a água que cai de um céu cinza como meus últimos meses vai lavando a alma, levando o peso de uma ausência sempre tão presente nas minhas noites, deixando um falso rastro de esperança que se esvai no amanhecer.
Depois da fúria indomável, a chuva de verão, assim como a paixão, logo passa e o que resta até que ela vá embora de vez: um tilintar de gotas que caem invadem os ouvidos como uma canção de ninar me fazendo cair lenta e gradativamente no sono tranquilo, de quem já nem sabia mais o que era. Sorri. Não por estar feliz por começar a esquecer, mas por saber que apesar de todos os estragos, a gente pode reconstruir aos poucos uma nova maneira de viver.