O livro que dá sequência às peripécias de Hugo em A Arma Escarlate e A Comissão Chapeleira finalmente chega ao público em plena Bienal do Livro que está acontecendo no Rio de Janeiro nesta semana. A escritora Renata Ventura autografou O Dono do Tempo e os volumes anteriores no estande compartilhado da editora Novo Século e LeYa do Brasil. A mesa aconteceu às 16h do dia 31 de agosto (sábado).
Seus livros são como um spin-off de Harry Potter, mas trabalha com riqueza de detalhes e situações como seria uma escola de magia no Brasil. Renata Ventura consegue implementar discussões sociais, históricas e até mitológicas em uma trama tão bem escrita que só emancipa a qualidade da literatura brasileira contemporânea.
Segundo a autora, o terceiro livro se passa na região Norte e começa explorando as consequências – negativas e positivas – do final de A Comissão Chapeleira. Convidada pela equipe do Cabana, ela concedeu uma entrevista exclusiva (abaixo), mas não deu muito detalhes sobre o conteúdo da sequência.
Entrevista com Renata Ventura
Cabana do Leitor (CDL): Quando e como você decidiu escrever A Arma Escarlate? Você já sabia que ia ser uma série no início?
Renata Ventura (R.V.): A primeira ideia que eu tive era mostrar como seria o Brasil bruxo. E eu queria um protagonista de comunidade para falar de toda essa questão social e também porque não tem nada mais brasileiro do que isso. E a segunda coisa que eu pensei foi que seria necessário cinco escolas no Brasil porque uma só seria superlotada. Aí tive a ideia de fazer uma escola em cada região e, automaticamente, veio a necessidade dos cinco livros.
CDL: Você sempre sonhou em ser escritora? Na época chegou a considerar as dificuldades de empreender essa jornada no Brasil? Chegou a sonhar em ter outra profissão?
R.V: Eu sempre quis ser escritora, ou presidente da república ou astronauta [risos]. Quis ser escritora porque eu sempre gostei muito de ler e ver filmes, mas, na verdade, eu queria contar histórias. Então eu tive que decidir entre escrever livros ou fazer filmes, aí escolhi que escrever era melhor porque eu poderia ter mais controle sobre o produto final.
CDL: Suas história falam de magia, mas também de amizade, amor, companheirismo e lidar com as diferenças, mas principalmente com as dificuldades de estudar em uma escola de elite no Brasil. Partindo disso, você preferiu abordar este tema devido à educação precária brasileira? Fale um pouco sobre isso. Você estudou em escola pública ou privada?
R.V: Estudei em escola privada, mas eu via a grande dificuldade que existia no sistema público de educação. E eu sempre fui muito educadora, sempre quis ensinar para outras pessoas. Meu primeiro aluno foi meu irmão, pois eu voltava da escola e ensinava para ele o que eu tinha aprendido. Mas eu via a educação brasileira e como ela estava sucateada e me frustrava porque eu sempre quis que o Brasil fosse um país melhor. Porém, mesmo na escola privada, às vezes a gente não aprende tudo o que deveria como brasileiros. Eu via que a gente não aprendia nada sobre a mitologia brasileira. Eu fui conhecer tudo isso quando pesquisei para escrever os livros. Acho que rola muito preconceito também. Eu mesma tive essa resistência com a cultura brasileira. Só queria ver filmes americanos, ler histórias de fora e morar nos EUA, mas quando eu morei lá, voltei apaixonada pelo Brasil.
CDL: Como foi essa adaptação do folclore brasileiro para uma escola de magia no Brasil?
R.V: Na escola de Harry, eles utilizavam a mitologia europeia, então se eu ia escrever uma história de magia sobre o Brasil, precisava colocar a mitologia brasileira. E eu tinha preconceito com a mitologia brasileira porque eu não a conhecia. O que eu tinha aprendido sobre isso foi um folclore infantilizado, com aquelas criaturinhas simpáticas, animadas e sorridentes. E aí quando eu fui pesquisar (de má vontade) para o livro, descobri que a gente não conhece o folclore brasileiro. O saci, por exemplo, não é aquele cara camarada do Sítio do Picapau Amarelo, mas sim um ser assustador, um demônio feito para amedrontar adultos. Me surpreendi muito com a quantidade de lendas de nosso país, que são incríveis! Tem os copendipe, uma lenda de Tocantins, que é uma tribo indígena com asas de morcego. Eu vejo que na região Norte se aprende mais sobre isso. Aqui no Sudeste é que as pessoas não ligam muito.
CDL: Você pensa em escrever outros livros quando esta série terminar ou já está escrevendo algum?
R.V: Eu tenho planos, mas não comecei nenhum porque seu começasse a escrever outras livros agora, meus leitores iam ficar malucos.
CDL: Mas seriam histórias também no mundo da magia?
R.V: Não. Os que eu pensei, não. Mas seriam no Brasil.
CDL: Você prometeu cinco livros para esta série, cada um explorando uma escola regional, o que é bastante interessante. O projeto ainda continua? O que você espera mostrar em cada região?
R.V: Esse ainda é o plano, mas a princípio serão mais volumes. Planejo um sexto livro com a história do vilão principal. Ele já apareceu nos primeiros romances. Alguns já sabem até quem é. Agora eu estou pesquisando para o quarto livro, que vai se passar no SUL. Eu quero mostrar a diversidade que existiu nestas regiões. Por exemplo, neste terceiro livro que explora a Amazônia, haviam mais de 300 etnias diferentes e a gente tem a tendência de achar que é tudo índio. Inclusive eles não gostam de ser chamados assim porque essa palavra não tem nada a ver com eles, nem se originou da cultura deles.
CDL: Conte um pouco sobre “O Dono do Tempo”. O que os leitores podem esperar desta nova obra?
R.V: O terceiro livro vai começar com os personagens lidando com as consequências dos últimos acontecimentos do segundo. Mas eu não posso contar nada sobre a temática do livro para não revelar a história. Entretanto o tempo é um tema recorrente neste volume, de várias formas.
CDL: O que você diria para um leitor seu que lhe questionasse “Por que o Capí nunca revida uma grosseria praticada contra ele?”
R.V: Ele está nessa busca para ser uma pessoa melhor. Então ele se controla, mas ele tem as raivas dele. O Capí, por morar na escola, também acha que seria bom se controlar para não perder a bolsa de estudos e a moradia. Tem algumas pessoas que se incomodam com o fato do Capí ser “perfeitinho”, mas eu conheço gente que é melhor que o Capí. Existe gente assim!
CDL: Gostaria de deixar alguma mensagem para o seu público?
R.V: Eu gostaria muito que todo mundo fosse mais Capí. Eu quero ser um pouco mais Capí. O ódio faz muito mal para nós, tanto emocionalmente quanto fisicamente.