Escrito por Jason Reynolds, o livro foi lançado com exclusividade em julho deste ano na caixa #009 do Clube Intrínsecos pertencente à editora Intrínseca e liberado para o público geral em agosto. Além de Daqui pra baixo, o autor também escreveu Fantasma que foi finalista do prêmio National Book Award de literatura jovem em novembro de 2016.
Daqui Pra Baixo conta a história de Will, um rapaz de 15 anos, morador de uma área dominada por gangues, que presencia a morte de seu irmão e mentor, Shawn, mais uma vítima da violência que predomina o lugar.
No território de Will existem 3 regras: Não chorar, não dedurar ninguém e se vingar, caso matem alguém que você ama.
Depois de seguir as duas primeiras regras à risca, o jovem pega o elevador decidido a cumprir a terceira e vingar a morte de Shawn, acabando com a vida de quem ele ACHA que atirou no seu irmão. O que ele não esperava é que os 67 segundos – tempo que o leva do sétimo andar para o térreo – seriam os mais longos da sua vida.
67 segundos. Uma arma. A dor do luto. O desejo de vingança.
Uma viagem curta de elevador leva Will a uma jornada de autoconhecimento e um confronto emocionante com seu passado.
“Só mais uma coisa sobre as regras:
As regras nunca devem ser quebradas
As regras são feitas para gente quebrada seguir”
Jason Reynolds, conhecido por abordar questões sociais em seus livros, não fez diferente com Daqui pra baixo. Usando o protagonista, ele retrata a realidade de diversos rapazes que passaram e passam pela mesma situação em territórios dominados por gangues.
Assim como o Will, desde pequenos os meninos vivem em meio a guerras de facções rivais, sendo enquadrados em regras como as da narrativa. Como muitos desses territórios são esquecidos pela lei, as gangues criam seu próprio tribunal em que geralmente a vingança é feita no estilo “Olho por olho, dente por dente”. Dentro deste ambiente hostil, grande parte desses rapazes acabam sucumbindo ao crime, seja por obrigação, necessidade, ou apenas pelo desejo de uma vida “fácil” e de luxo.
“A noite rouba de você cada lição,
coloca uma arma na mão,
um ronco na barriga
e até os nossos dentes a noite afia.”
Através da história contada em versos, somos levados a momentos de reflexão profunda, e conhecemos uma faceta crua do sentimento de vingança. O cuidado do autor em nos apresentar exatamente o que se passa na cabeça de Will nos possibilita acompanhar o furacão mental do menino diminuir a cada andar descido, até que tudo que sobra é um adolescente assustado no calor do luto, que tem muita raiva e uma visão deturpada do que é justiça.
“Eu nunca mais vou dormir
Acreditando nele ou
acreditando que ele
mais cedo ou mais tarde
vai voltar pra casa, porque
não vai, e acho que agora
eu devia amá-lo mais
como se ele fosse o melhor do mundo
e isso é difícil demais
porque ele era meu único
irmão, e já era
o melhor do mundo.”
Durante o enredo, o autor nos apresenta personagens marcantes, que fizeram parte da vida do protagonista, cada um com uma história, mas todos com algo em comum: tiveram uma vida ceifada pela violência. Cada uma dessas figuras releva segredos que mexem cada vez mais com a mente de Will, mostrando que o ciclo de violência, de vingança, de sede de sangue, uma hora precisa acabar.
Ao ler essas histórias somos transportados para uma realidade em que a violência bate o martelo e define o resto da vida de uma pessoa. Com versos pesados e significativos, somos surpreendidos com uma sede enorme pelo desfecho do enredo.
“Sirenes para todo lado
cada uivo cortando
o barulho da cidade.
Mas não os gritos.
Os gritos sempre são
mais alto que o resto.
Até que as sirenes”
Daqui pra baixo, além de uma leitura emocionante, também propicia um convite à autodescoberta. O final aberto feito de maneira engenhosa pelo autor é uma maneira de evidenciar o preconceito enraizado na sociedade. Infelizmente, somos projetados para marginalizar meninos como Will e puxarmos o gatilho mesmo antes de eles colocarem a arma na mão. Geralmente não passa pela nossa cabeça que esses meninos, apesar de muitas vezes não terem escolha e enfrentarem uma batalha interna entre a sua vivência violenta e o que achamos correto socialmente, tenham uma chance de redenção e sigam por outro caminho, longe do vínculo de violência que os cerca.
Como sociedade falhamos quando reproduzimos “eles têm escolha de mudar de vida”, mas sequer lutamos, a início de conversa, para que eles tenham uma chance real de viver longe de toda essa violência… como nós.