Fabien Toulmé é responsável por grandes histórias, algumas já trazidas para o Brasil pelo Grupo Autêntica, selo NEMO. Essa não é diferente. Lançada em 2018, a HQ trouxe mensagens importantes e um final surpreendente.
Boudoin é um advogado que vive um cotidiano normal em um escritório sem graça e que acaba com sua paciência. Ele não possui uma vida pós trabalho e, apesar de ser bem sucedido financeiramente, não tem tempo para o lazer.
Sua vida dá um ponta-pé inicial com rumo à liberdade quando seu irmão chega na cidade. A partir disso, e com a descoberta de um problema grave de saúde, um câncer em fase terminal, o homem de semblante cansado e irritado dá vida ao adolescente sonhador interior.
Será que só sucesso financeiro basta? Essa é a pergunta chave da narrativa. Luc traz à seu irmão a questão em alguns diálogos durante os primeiros encontros e, ao contrário do mais novo, tem sua vida muito badalada. Trabalhando para ONGs, ele é um viajante que adora liberdade e conhecer novas pessoas e lugares.
O ponto alto da história é a descoberta do tumor maligno em Boudoin. Sabendo que teria apenas alguns poucos meses de vida, ele decide, com a ajuda de Luc, fazer uma lista de sonhos a serem realizados e partir para uma aventura na África com seu mais querido companheiro de família.
A amargura e a obsessividade de um dos garotos dá lugar à realizações pessoais arrancadas pelo pai quando mais novo. É um alívio e ao mesmo tempo doloroso ver Boudoin feliz. Fabien tem o coração de seus leitores na mão e, não importa a história, isso sempre termina em lágrimas… seja de felicidade ou não.
Tanto Não era você que eu esperava, quanto Duas Vidas ou, o último lançamento da editora, A Odisseia de Hakim, tem a capacidade de encantar os antigos e novos fãs do autor. Seus personagens, sempre tão reais, dão conta de levar quem quer que seja à reflexão, ao tempo histórico ou aonde Fabien quiser. Este tem como forte característica dos seus personagens a humanidade, como exemplo, as recaídas de Boudoin, que conta com a ajuda de Luc para administrar seu caos mental.
A utilização de flashbacks intercalados com as continuações do texto servem para que o leitor entenda as motivações do que levou Boudoin a ser como foi primeiramente apresentado. A arte ajuda facilmente a destacar o agora do antes, já que os flashes são criados em tons amarelados, como de câmeras antigas, e o presente possui cores maduras. O quadrinho traz o traço característico do autor, que é sempre muito bem representado.
É o tipo de literatura ótima para quem não conhece histórias (sem heróis) nesse formato. Quadrinhos podem ser uma ótima alternativa pra quem está em “ressaca” literária, e esse, além de uma belíssima história acompanhada de uma ilustração tão bonita quanto a parte escrita, também mostra os valores da vida.