A quarta sessão de Bianca Cadore foi extremamente dolorosa. Especialmente o plano na qual a câmera está em primeiro plano sobre Leticia Sabatella, em que ela então se despe do casaco, mostrando seu corpo inteiramente machucado, analogamente enquanto se despe da vergonha e liberta também sua raiva é cruel. Ver todas aquelas marcas, que já estão quase empalidecendo é difícil. Zecarlos Machado demonstra bem a angustia e o impacto da imagem em Theo. Ainda mais difícil é perceber sua fixação no companheiro agressor.
Bianca vive uma relação de masoquismo com o Marido. Apesar de, como Theo salienta, estar possivelmente correndo risco de vida, ela mantem-se na relação, revelando todo o gozo que sente – inclusive referindo-se a um gozo concreto, do sexo pós-brigas. A excitação advinda dessa situação é exposta sem vergonhas. É importante que se desmistifique essa relação de dependência da mulher objeto de agressão. Ela pode até estar ali por que quer – mas é um querer que vai além do consciente crítico. É necessária uma compreensão especial dessa posição difícil, sem contudo, livrarmos o sujeito de se implicar nessa posição. Ainda que também soe doloroso a cena final, e Theo ocupe a posição de analista não se disponibilizando a ir à delegacia com sua paciente – é uma decisão que cabe a ela e ela precisa chegar a essa conclusão bem como toma-la sozinha, ficando um gosto amargo na boca e uma sensação de que essa história não terminará bem;. Mas é preciso que Bianca se implique nas consequências da manutenção de sua posição. Ela veicula que não quer mais amar como ama, e somente quando um analisando quer se ver livre de um sintoma que o desejo pode virar demanda e uma análise acontecer de fato.
O problema não é (só) Bianca apanhar, mas que tipo de relação ela estabelece e como ela vivencia o Amor. Mais uma vez, suas sessões remetem ao filme “Amor?” de João Jardim, que aborda brilhantemente relacionamentos violentos, se questionando se aquilo é Amor. Mas de fato, quem somos nós para definirmos o que é o Amor? Freud já discutia em sua obra, apontando o entrelaçamento das pulsões de vida e de morte (Eros e Thanos), e se questionava se o ódio poderia ser anterior ao Amor, não como seu contrário, mas como seu complemento. Temos, a partir da visão romântica, a existência de um amor belo e desprendido, e separamos na nossa sociedade um entendimento que a paixão é doentia e o amor é altruísta. Mas será isso mesmo? Se analisarmos o sentimento Amor existente entre pais e filhos veremos um exemplo muito claro de amor e ódio amalgamados, e em alguns casos, estilos de amor maternos extremamente obsessivos e dominadores. É uma das discussões mais complexas que pode se travar.
As sessões de Bianca giram no mesmo assunto, mas pouco a pouco, a personagem é bem trabalhada e desenvolvida pelo Roteiro. E elogiar Letícia Sabatella novamente é chover no molhado – a atriz representa uma mulher contida, sofrida, Rachada e quebrada, cujos cacos Theo encontra uma enorme dificuldade em juntar. Ela estar envolta em roupas de um tom roxo azulado nos remete à morte, tradicionalmente ligada, em linguagem audiovisual ao roxo e ao preto. O Vício na dor – e no amor – que Bianca demonstra ter é algo dificílimo de ser descontruído e isso fica ainda mais claro nesse episódio, quando ela é confrontada com essa visão do amor como um sentimento sofrido – retornamos então à analogia do Inferno de Dante e como essa amor levou-os ao Inferno.
Bianca inicia a sessão de pé, próxima a janela, histérica. E assim ela ainda permanece. Resta-nos mais do que torcer pela sua integridade física, precisamos esperar que ela queria romper com essa sua forma de amar e ser amada.
Assista Sessão de Terapia: no Canal GNT, de segunda à sexta às 22h30. Maratona com todos os episódios da semana aos Sánados 21h30 e Domingos 18h.